Todos têm os seus gêneros favoritos de mídia, seja ação, aventuras e outros. Mas, vamos admitir que terror é o gênero que recebe mais rejeição.
Dando uma conversada com pessoas que declaram odiar o gênero, percebi que o principal motivo é o som mais alto do que as produções de outros gêneros, especialmente nos momentos de sustos.
Na maioria das vezes, os efeitos sonoros são muito altos, usados de maneira orquestrada, na maioria das vezes sem substância, sem graça, com a finalidade apenas de causar susto pelo inesperado.
Esse recurso rudimentar afasta pessoas, que veem o terror como uma mídia que não tem muito há a oferecer.
Por anos, o gênero foi super saturado, com produção de filmes horrendos (sem trocadilho) e que, até hoje, arruínam a reputação dessas produções e inibem novos adeptos.
Felizmente, filmes como A Coisa ou jogos como Resident Evil, mostraram que produções de terror podem ter um coração e irem muito além dos sustos e barulhos.
Para falar sobre filmes de terror, é preciso também falar sobre como abordam temas inquietantes e tristes, como saúde mental, por exemplo.
Tem um filme de terror que indico a todos que gostam do gênero – e até a quem não gosta também: O Babadook.
O filme trata sobre uma família que é desunida, devido a mãe ter dificuldade em amar o próprio filho, por causa da morte do marido e o aniversário do rebento ocorrerem na mesma data.
Eles sofrem com essa falta de conexão por anos, até o filho encontrar um livro chamado, O Babadook, e por meio do livro trazer um monstro para a casa.
O monstro é, na verdade, um sentimento que se materializou. Especificamente, o sentimento da mãe, que não superou a morte do marido e não conseguiu seguir em frente com sua vida, alimentando sua alma de amargura e tristeza.
Sem dar spoiler (mas já dando), o final surpreende e acaba servindo de metáfora para nós, espectadores, porque não pulamos de felicidade quando mandamos “nossos monstros” embora. Mas, aprendemos a lidar com a dor e damos a ela o espaço necessário.
No campo dos jogos, destaco Cry of Fear, por tratar sobre depressão de uma forma tão madura.
O jogo fala sobre a jornada de Simon Hendrikson para chegar à casa de sua mãe e sua luta contra criaturas horrendas que querem um pedaço (ou vários) dele.
O jogo, na verdade, é uma projeção daquilo que o personagem vai escrevendo, para tratar sua depressão. E cada detalhe da jornada é uma reflexão de suas frustrações, que, dependo do resultado obtido pelo jogador, o leva ao suicídio.
Simon sempre se sentiu sozinho e perdeu a pessoa que mais amava, Sophie, e, na sequência, perde também as pernas em um acidente de carro.
Como ele sempre se sentiu tão miserável, a perda dos membros destruiu sua mente e o levou a virar paciente do Dr. Parnell, de quem ele não gosta muito.
Tendo isso em mente, do design dos inimigos e seus comportamentos, aos quebra-cabeças, cada detalhe da aventura que se joga é uma reflexão da raiva e tristeza do Simon.
Um exemplo: um dos quebra-cabeças leva o jogador para uma maleta onde está escrito “eu quero meus pés de volta”. Ou alguns inimigos que se matam quando estão com a última bala na arma ou quando o jogador se aproxima.
O jogo tem quatro finais possíveis, que dependem de duas ações que precisam de contexto.
Na metade de jogo, o gamer enfrenta um boss chamado Carcaça, que é a manifestação da frustração amorosa do Simon e se é apresentada com uma escolha: fugir ou lutar (lutar quer dizer que Simon decidiu enfrentar suas frustrações e fugir é o contrario).
As duas produções me ajudaram a ver que o terror pode ir muito além da tentativa de assustar o espectador ou jogador.
Acho até que tem um quê de genial em usar esse gênero para falar das tristezas mais profundas do ser humano e ainda ofertarem uma mensagem de ajuda.
Vamos combinar que se um filme ou jogo de terror consegue transmitir a mensagem de que por pior que as coisas estejam, elas podem melhorar (especialmente se contar ajuda de quem está estendendo a mão), então vale a pena acreditar na força dessa mensagem.