Criar uma história por si só já é difícil e sempre conta com alguns percalços, dependendo da forma como será contata.
Nos filmes, a preocupação é com ângulos e filtros, fundamentais para contar bem uma história.
Já nos livros, a preocupação deve ser com os jogos de palavras, que precisam ser bem articulados para levar o leitor às emoções desejadas pelo autor.
E não é fácil sincronizar personagens diversos, suas ações, seus ambientes de ação e outros elementos narrativos convencionais.
Nos jogos, as narrativas tendem a seguir o mesmo fluxo: jogar – cena para progredir a historia; jogar – cena até o fim do jogo.
São em média 200 mil linhas de código de verificação que garantem que o jogo funcione.
Talvez, por isso, jogos tendem a deixar narrativas de lado, para focar na fluidez de movimentos e combates.
Entretanto, tem histórias, como Dragon’s Dogma, que tem fórmula de jogo simples em detrimento de maior ênfase na narrativa, contada como mass effect.
Há também jogos que tentam fundir os dois para criar narrativas que só podem ser feitas nesse tipo de mídia.
E agora, finalmente, chegamos ao ponto central do tema de hoje. Em particular, do jogo que inaugurou esse novo tipo de design, Bioshock.
Antes de falar sobre a narrativa de Bioshock, é preciso expor a premissa principal do jogo. O gamer joga como Jack, que durante uma viagem, seu avião cai no mar e o acidente resulta na morte de grande parte dos passageiros e tripulantes.
Jack consegue nadar até um farol, próximo ao local da queda. Só que, na verdade, o farol, é um elevador para Rapture, a cidade submarina, criada por Adrew Ryan.
Em Rapture, a uma sociedade é livre de ideais, que, na cabeça de Andrew, limitavam as pessoas e as fazia injustas.
A cidade de Adrew Ryan é um paraíso de ciência, da filosofia, sem crenças limitantes em deuses ou governos.
Ao chegar nessa cidade e ver uma pessoa sendo morta por uma espécie de ser um mutante, você (gamer) recebe ajuda de um homem chamado Atlas – e este será seu guia durante todo o jogo.
Bom, essa é a premissa básica de Bioshock.
Mas, o que realmente é forte no jogo é o fato de Atlas passar o tempo inteiro lhe dando sugestões de o que fazer.
“Você poderia…?” é perguntado o tempo inteiro ao jogador, que, sem perceber, acaba seguindo todas as “sugestões” cegamente.
A lógica é: se o Atlas é um guia oferecido pelo próprio jogo e está apontando caminhos e soluções para os percalços ao longo da jornada, então por que não ouvi-lo?
Momento spoiler: No fim do jogo, é revelado que Jack é ativado pela frase “Você poderia…?” e desde o início esteve sendo usado por Atlas.
A genialidade de tudo isso é que, assim como o Jack, nós, jogadores, seguimos cegamente as ordens de Atlas. Não por escolha, mas porque a frase-gatilho torna o jogador um escravo, assim como o personagem que se joga.
O criador do jogo usou o termo “dissonância ludo-narrativa” para se referir à nossa aceitação dos conceitos surreais de jogos (barras de vida, reviver, etc.).
E como é difícil encaixar esses conceitos em uma história. Em uma boa história, pelo menos.
Após Bioshock outros jogos de sucesso implementaram suas narrativas em mecânicas, como Dark Souls e Undertale. Esses foram dois dos jogos mais influentes da década passada. O primeiro, criado um novo gênero com ênfase em história e dificuldade, o Souls-like.
Jogos tendem a priorizar a diversão do jogador, sem levar muito em conta a história.
Por isso jogos como Bioshock são incríveis, uma vez que têm a capacidade de unir jogabilidade e narrativas, promovendo uma experiência única, que será lembrada por década décadas após seu lançamento.