Há duas semanas, o vídeo mais visualizado no Brasil é o do humorista Rafael (que não divulga o sobrenome e prefere ser chamado pela alcunha artística, Esse Menino), que usa as tentativas da farmacêutica Pfizer em fechar contrato com o governo brasileiro para fazer uma paródia.
No vídeo, de pouco mais de três minutos, a Pfizer é uma mulher que não se valoriza, correndo atrás de um ‘boy lixo’, que não responde às suas mensagens.
Segundo Esse Menino, ele levou apenas 15 minutos para fazer o divertido roteiro. O vídeo foi publicado no dia 9 de junho e imediatamente ganhou o gosto de internautas e hoje caminha para as 18 milhões de visualizações.
Graças a esses fenômenos que acontecem com certa frequência no mundo digital, o rapaz de 25 anos saltou de cerca de 40 mil seguidores (uma marca muito boa para quem cadastrou o perfil em 2018, com apenas 74 postagens) para mais de 880 mil.
Entre os seus seguidores está o maior fenômeno do Instagram no Brasil e que também tem destaque internacional na plataforma pelo engajamento de suas publicações, Juliette Freire, vencedora do BBB 21.
Mesmo quem trabalha com marketing digital tem dificuldade em explicar certos fenômenos que ocorrem nas redes sociais, em especial o Instagram.
Um paralelo: tenho uma colega de profissão (Cléo Oliveira) que possui um dos perfis de Instagram mais bacanas que conheço. Suas postagens têm bom conteúdo, com formato atraente, boas fotos e efeitos visuais. Além disso, ela é bonita, divertida e inteligente. Mesmo assim, seu perfil, criado em 2013, conta com apenas 2.713 seguidores.
No mundo digital as coisas são assim mesmo. Você passa anos trabalhando arduamente em suas postagens para ganhar um seguidor aqui, outro acolá.
No geral, é um trabalho de perseverança mesmo.
Mas, em alguns casos, uma postagem, feita de maneira despretensiosa, rompe a barreira do perfil e passa a ser compartilhada (com sorte, por alguma celebridade também) e finalmente alcança o Panteão dos perfis cortejados pela plataforma e por anunciantes.
Esse Menino tem um perfil interessante. Ele é engraçado, tem posicionamento político, é militante gay e se apresenta como comediante.
Sua melhor postagem é realmente a da Pfizer, mas têm outras com potencial para likes e que graças ao vídeo mais famoso, passaram a receber novas visualizações.
Ter uma postagem que viraliza e alavanca a conta de seu protagonista não é raro. Acontece até com certa regularidade, cabendo ao dono da conta lutar para manter os novos seguidores conquistados no calor do sucesso do post viralizado.
Seguidor é “bicho” volúvel e mantê-los também dá trabalho.
O fenômeno Juliette Freire é outra coisa. A paraibana que chegou a ser chamada de “namoradinha do Brasil”, tinha pouco mais de três mil seguidores quando entrou no BBB, em janeiro deste ano. Cinco meses depois, conta com 31,1 milhões, quebrando alguns recordes.
O primeiro deles é que a plataforma não tem registro de alguém conquistar um número tão expressivo de seguidores em tão pouco tempo.
Poucos brasileiros possuem um número tão alto de seguidores. E aqueles que têm os conquistaram ao longo de anos de relacionamento virtual. E muito trabalho, auxiliado por profissionais da área.
Não existe uma resposta simples para o fenômeno protagonizado por Juliette Freire. Isso é o resultado de um sem número de fatores, incluindo aí até o alinhamento de Júpiter com Saturno, na casa de Touro.
Dias atrás assisti entrevista de um marqueteiro digital (desses famosos, que faturam milhões agenciando clientes com potencial de faturamento em redes sociais).
Quando lhe pediram para explicar o fenômeno Juliette, ele deu a resposta mais tola que já ouvi na vida: autenticidade.
Segundo o marqueteiro, ela ganhou esses seguidores porque foi ela mesma, era verdadeira, autêntica, a Internet reconhece isso e não tolera o contrário.
Não vou nem entrar no mérito da declaração de que seguidores gostam de autenticidade e não perdoam o contrário. Até porque, qualquer pessoa é capaz de perceber por si só que o mundo virtual é palco para apresentar a melhor versão de si mesmo. Quase nada ali é autêntico.
Internauta gosta de fantasia. Realidade ele já tem de sobra. Mas isso é assunto para outro artigo.
O caso de Juliette passa, necessariamente, pela carência do povo brasileiro de se unir em torno de uma causa maior, que foi defender Juliette de todo o mal, representado por boa parte de seus colegas de confinamento.
Divididos pela dicotomia política, os brasileiros se uniram para odiar Karol Conká (que também bateu recorde, sé que de rejeição) e amar Juliette, escolhendo-a como vencedora do reality show logo na segunda semana do reality e multiplicando seus seguidores semana após semana.
Fora isso, uma administração certeira do perfil (que contou inclusive com especialista em produção de fake news, com serviços prestados em campanhas eleitorais em São Paulo) e a visibilidade do programa fizeram o resto.
Se autenticidade fosse suficiente para alavancar perfis, a própria Juliette não teria esperado tanto para ampliar seus seguidores, já que sua conta existe desde 2013.
Além disso, a moça, que conseguiu inclusive vencer a barreira da xenofobia velada que existe contra os nordestinos, continua mandando no Instagram, superando celebridades internacionais no quesito engajamento.
Qualquer postagem sua conta com milhões de likes, comentários e compartilhamentos. Qualquer produto que use ou indique tem os estoques esgotados. É disputada a tapa por fabricantes de tudo, dado o seu potencial de converter os engajamentos em compra.
Enfim, mesmo usando todas as ferramentas de análise disponíveis, é preciso reconhecer que alguns fenômenos não dão para explicar. A gente apenas aceita. E Juliette Freire é um deles.
Até a próxima.