Com o objetivo de estabelecer regras de convivência entre comunidades e o Parque Estadual do Jalapão (PEJ), especificamente com os grupos familiares que tem como atividade o uso comum da terra, bem como estabelecer condições de uso e manejo das terras e dos recursos naturais no território, comunidades quilombolas, o Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins) e Ministério Público Federal (MPF) assinaram Termos de Compromisso na Comunidade Carrapato, em Mateiros.
Participaram das assinaturas, o presidente do Naturatins Renato Jayme; o procurador da República Álvaro Manzano; Antônio Alves da Silva, presidente da Associação das Comunidades Quilombolas do Carrapato, Formiga, Mata e Ambrósio; Valter Gomes Batista, presidente da Associação Jalapoeira das Comunidades Quilombolas do Território Boa Esperança; Railane Ribeiro da Silva, presidente da Associação de Artesãos e Extrativistas do Povoado Mumbuca.
Com a vigência de quatro anos, o termo, que foi construído a partir de rodas de conversa com as comunidades, visa a união de esforços para o desenvolvimento sustentável e está alinhado com a Política Nacional do Meio Ambiente e com a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais, a fim de incentivar práticas que busquem conciliação entre a necessidade de preservação e conservação dos recursos naturais e a sobrevivência e bem-estar social das famílias residentes em território quilombola.
“Precisamos sempre discutir e equalizar bem sobre as medidas a respeito daquilo que tem que ser feito, daquilo que pode ser feito, para que a gente venha a preservar o meio ambiente. E, que a cultura e os valores que vocês têm, nas suas famílias e nas suas comunidades, e a relação com a natureza, sejam sempre fortalecidas”, destacou o presidente Renato Jayme em fala às comunidades.
Permissões
São permitidas 12 atividades, entre estas estão as seguintes: agricultura familiar, segundo uso e manejos tradicionais, o que inclui roças de toco, esgoto e vazante; criação de animais domésticos necessários à alimentação das famílias, trabalho e transporte de carga; extração de madeira e palha, exclusivamente para fins domésticos; extrativismo vegetal de frutos, folhas, cascas e raízes; coleta de seda do buriti e capim-dourado para fins artesanais; pesca artesanal; queima controlada para atividades tradicionais como criação de gado, coleta de capim-dourado e aceiros em conformidade com calendário de queima anual e planejamento do Manejo Integrado do Fogo (MIF).
Os termos dão segurança às atividades que a comunidade já faz secularmente, como é o caso do seu Enerci Matos, morador da Comunidade Carrapato, que recordou aspectos da vivência do povo sertanejo e da boa relação construída com o Naturatins ao longo dos anos. “A queima serve para o sertanejo, é uma ferramenta de trabalho. Aqui temos o capim-dourado, sem a queima, não há capim-dourado. Fazemos também a criação de gado, que está saudável, desde que a gente faça queimas dentro do limite, e ninguém melhor para fazer do que quem mora no lugar. Meu pai tem 88 anos e ensina a fazer o fogo sempre com a lua cheia, nunca na lua nova e sempre nos horários mais frios para não atingir as matas, é a experiência que a gente tem. Nossa comunidade vive do buriti, do óleo do buriti, do óleo do pequi. Tudo isso precisa do fogo, se não queimar, não vem bem”, argumentou.
Railane Ribeiro da Silva, líder da associação, comemorou a assinatura do documento que é resultado de um trabalho coletivo. “Essa luta não é só nossa do Mumbuca ou do Carrapato, porque unidos temos mais forças. Esse termo é o que garante a usar nossas coisas dentro da lei, é um documento importante demais, dá legalidade para trabalhar na nossa rocinha, tirar a madeira, colocar nosso fogo. Essa ligação entre Naturatins, Prefeitura, MPF e as comunidades é boa demais, todos estão conscientes”, pontuou.
A gerente de Suporte ao Desenvolvimento Socioeconômico do Naturatins, Vanessa Braz, explica que, entre outras atribuições, cabe ao órgão ambiental ser canal de suporte, buscando formalizar parcerias entre o Naturatins e instituições públicas e/ou privadas no intuito de auxiliar as comunidades com capacitações, cursos, planejamento do MIF para a prevenção, controle e combate aos incêndios florestais, dentre outras demandas que são trazidas pelos comunitários. “A assinatura da renovação do Termo de Compromisso com as comunidades quilombolas residentes no PEJ é muito importante não só para assegurá-los da manutenção de suas práticas sociais e econômicas tradicionais, mas também para o órgão ambiental conseguir com bases legais alinhar formas de como pode dar o suporte devido no que for pertinente ao auxílio do desenvolvimento sustentável dessas comunidades, enfatizou.
O procurador da República Álvaro Manzano relatou o processo de construção dos termos de compromisso e as discussões para definir as permissões de atividades no PEJ que foi iniciada em 2009. “A maior dificuldade foi com a questão do fogo. A comunidade tem o conhecimento tradicional, só que para o ICMBio [Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade] e o Naturatins é importante também o estudo e a pesquisa, que veio com uma pesquisa da UnB [Universidade de Brasília], que mostrou que o uso do fogo não causa danos ao meio ambiente se for feito de forma correta. Hoje, depois de mais de 10 anos de trabalho, vemos uma relação completamente diferente entre o Naturatins e as comunidades, os dois trabalhando juntos com a mesma finalidade, que é preservar o meio ambiente e garantir a sustentabilidade das comunidades”, detalhou.
Para o diretor de Biodiversidade e Áreas Protegidas do Naturatins, Warley Rodrigues, os termos oportunizaram uma relação amigável com as comunidades. “Quando surgiu essa oportunidade, uma ferramenta de acordo, foi muito interessante porque havia uma situação de conflito. Então, esses termos apaziguaram e trouxeram uma relação amigável, tudo que foi pactuado e acordado entre as partes é jogado dentro desses termos e ele é cumprido. O primeiro foi de dois anos e, agora, de quatro anos. É interessante porque é uma ferramenta de gestão social e de resolução de conflitos, o que melhorou muito o relacionamento entre o Naturatins e a comunidade. A partir destes termos de compromisso começamos a ter uma identidade com a comunidade e ela com a gente. Isso gerou uma relação de confiança o que propicia boas ações e bons resultados na gestão do território onde engloba o Parque do Jalapão”, destacou.
Após a assinatura dos documentos, cada comunidade recebeu da supervisora Área de Proteção Ambienal (APA) do Jalapão, Rejane Nunes, calendários anuais que fazem parte do planejamento do MIF construído por meio do diálogo entre Naturatins e comunidades. No cronograma estão dispostos os meses adequados para as atividades como a queima de vereda para pasto; os aceiros e a queima do Cerrado para o gado pastar; os aceiros e a queima de vereda para a renovação do capim-dourado; a coleta do capim-dourado e a queima para roça de toco.